04 de Maio de 2020
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Produtores europeus pressionam a União Europeia a barrar importações de carnes bovina e de frango, além de etanol do Brasil e de outros exportadores, sob a alegação de que enfrentam uma situação sem precedentes em razão da pandemia de covid-19. Eles afirmam que o confinamento imposto pelos governos do bloco golpeou o consumo e temem uma crise de excesso de oferta nas próximas semanas e meses, com o consequente aprofundamento da deterioração dos preços internos.
Produtores de carnes não reivindicam explicitamente um bloqueio, mas sim para a UE “ajustar as importações”. Na prática, querem a suspensão das tarifas intra-cota, que são mais baixas. Com isso, passaria a vigorar a tarifa plena, que de tão elevada se torna um impeditivo à entrada dos produtos citados no bloco. A poderosa central agrícola Copa-Cogeca argumenta que o segmento de carne bovina perdeu os canais de food service e catering com o fechamento de restaurantes e o desmoronamento do consumo fora de casa.
“Apesar dessas extremas dificuldades, cortes baratos [de carne] continuam a ser importados dos países do Mercosul”, reclama a Copa-Cogeca. A central pede “medidas excepcionais”, na forma de uma “gestão mais focada das cotas tarifárias”, para ajudar os produtores europeus. A carne bovina importada dentro de cota paga tarifa ad valorem de 20%. Fora da cota, a taxa vai de 40% a 45%.
Na mesma linha, a Associação de Avicultores, Indústria e Comércio de Aves na UE (Avec) também alega que os abatedouros de carne de frango tiveram que parar a produção para o mercado de food service, que absorve 20% a 40% da produção. E reclamam que a UE importa 850 mil toneladas de carne de frango por ano, sobretudo de Brasil, Tailândia e Ucrânia, e que essas importações entram através do sistema de cotas, com alíquotas mais baixas.
A Avec se queixa que, para não perder seus direitos pelas cotas, importadores continuam a comprar frango do Brasil, embora a demanda na UE tenha caído, e estocam a carne até que os restaurantes sejam reabertos. Além disso, a entidade diz que o surto de gripe aviária no Leste Europeu continua a afetar duramente produtores na Polônia, Hungria e Romênia, que tiveram mercados de exportação fechados. Os preços de carne de frango na UE já recuaram 20% e a tendência é de novas baixas, de acordo com a Avec.
“Consumidores ainda estão comprando frango e peru no varejo, mas isso não compensa a perda dos canais de food service. Nossa produção está sendo reduzida, o que por sua vez diminui nossa renda significativamente”, disse ao Valor o secretário-geral da Avec, Birthe Steenberg. “Assim, pedimos à UE para administrar a entrada de importações temporariamente, de forma a evitar uma crise de excesso de oferta”.
A alíquota dentro de cota é de 15,4% sobre o frango congelado, por exemplo. A vantagem tarifária faz com que exportadores brasileiros prefiram exportar frango com sal. Se fossem vender carne de frango in natura, teriam de pagar uma tarifa “impeditiva” de € 1.024/tonelada.
A Copa-Cogeca acionou a UE também por causa do etanol. Pediu “medidas imediatas de salvaguarda eficazes” contra as importações do produto proveniente dos EUA e do Brasil. A central alega que a produção europeia desmoronou e que, com as medidas de distanciamento social impostas no bloco e mundo afora, mercados de subprodutos vegetais usados na produção de biocombustíveis correm o risco de entrar num período de forte instabilidade com a demanda mais fraca.
A confederação agrícola europeia pede para a UE recusar demandas de suspensão temporária de tarifas de importação para o etanol e manter sobretaxas antidumping e antisubsídios aplicadas na importações do biocombustível americano. O Brasil exporta volumes pequenos para a Europa.
Os produtores europeus estão conscientes dos riscos de uma ação protecionista da UE. A Avec, porém, chega a dizer, em carta a representantes europeus, que, “porque estamos passando por uma situação sem precedentes, precisamos superar as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC) e tomar medidas sem precedentes”.
A Comissão Europeia, braço executivo da UE, tem sido refratária às pressões dos produtores, até pelo risco de represália de outros países, uma vez que o bloco também é um forte exportador agrícola. De qualquer forma, um porta-voz da Copa-Cogeca diz que a central continua esperando respostas às suas demandas. E que, até agora, a UE fez muito pouco por seus produtores, basicamente ações de apoio à estocagem de produtos como lácteos e vinhos.
Recentemente, Romênia e Bulgária quiseram barrar importações agrícolas, mas a Comissão Europeia os convenceu a não fazer isso. Mas, ao mesmo tempo, não hesitou em impor tarifa de importação de € 5,27 por tonelada de milho, sorgo e centeio, antes isentos. Segundo Bruxelas, a medida foi necessária por causa da diferença entre o preço de referência europeu e a referência mundial, que é o preço do milho americano no porto de Roterdã.
Essa referência declinou significativamente por causa do colapso do petróleo, que atingiu a demanda por milho para a fabricação de etanol nos EUA. Paralelamente, a colheita global do grão poderá bater recorde na safra 2020/21. A combinação fez o milho americano em Roterdã recuar para € 149,84 por tonelada, ante € 162,24 um ano atrás.
De toda a forma, a ação dos produtores europeus em meio à pandemia antecipa uma forte reação contra a futura assinatura e implementação do acordo UE-Mercosul.
Conforme a Comissão Europeia, a UE importa cerca de 200 mil toneladas de carne bovina do Mercosul por ano. Um quarto desse montante entra no mercado europeu apesar de sujeito a tarifas de 40% a 45%. Pelo acordo com o Mercosul, a UE dará cota adicional de 99 mil toneladas para a carne bovina com tarifa de 7,5%. O volume representa 1,2% do consumo europeu. A redução da alíquota será ao longo de cinco anos.
Das 850 mil toneladas de carne de frango importadas por ano pela UE, metade vem do Mercosul. Pelo acordo, a UE dará cota de 180 mil toneladas para Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, livre de tarifa. E no caso do etanol também haverá cotas.
Fonte: Valor Econômico - 04/05
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