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Plural defende venda exclusiva de etanol pelas distribuidoras

28 de Janeiro de 2019

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Questionada sobre a conclusão do Cade, que propôs à ANP a reanalise de uma série de normas que garantem a exclusividade das distribuidoras na venda de combustíveis, como a fidelidade comercial de postos com bandeiras e a venda exclusiva do etanol por meio das distribuidoras, a associação que representa a grandes empresas do setor, a Plural, enviou uma carta, que publicamos, a seguir, na íntegra.

A Plural vê com a apreensão a discussão sobre venda direta de etanol das usinas para os postos. A proposta que está sendo tratada em caráter emergencial nem sequer teve uma mínima avaliação dos impactos regulatórios e dos impactos tributários, bem como uma mensuração dos benefícios e/ou malefícios para o consumidor, e cria uma instabilidade jurídica desnecessária, abrindo precedente para o aumento da judicialização da questão.

A própria ANP, por meio de sua Procuradoria, tem sistematicamente se posicionado contra uma série de liminares judiciais que visavam autorizar a venda direta. Importante aqui ressaltar que todas estas liminares foram suspensas.

Sobre a venda direta, é importante esclarecer o seguinte:

Não existe estudo que mostre que haverá uma redução no preço do produto, pois esta operação tem um grande impacto no modal de logística. Análises preliminares apontam que na média Brasil os custos de logística com esta mudança subiriam mais do que a potencial redução da margem da distribuidora. Além disso, seria eliminado um elo de controle da qualidade do produto.

O modelo de abastecimento vigente no Brasil atualmente é respaldado pela ANP, que optou por definir um modelo a partir da divisão de responsabilidades entre produção, distribuição e revenda, justamente para garantir uma estrutura sólida e que permita o abastecimento de maneira segura e consistente, que propicie ao consumidor a chegada do produto a custos competitivos.

Uma estrutura que distinga os papéis envolvidos (produtores, distribuidores e varejistas/consumidores) e apresente como vantagens economia de escala que permita negociações em grandes volumes e otimização de fretes. E ainda um relacionamento comercial sólido entre distribuição e revenda que facilite a concessão de crédito aos agentes que operam no varejo e capilaridade que garanta a presença do etanol em todos os estados do país, por meio de bases de armazenagem em todas regiões geográficas. Este é um modelo que existe em todos os mercados do mundo e tem ampla competição em todos os elos da cadeia e, portanto, o consumidor é o real beneficiado.

Não menos relevante, este modelo absorve toda uma complexa estrutura de tributação e de arrecadação de tributos, um tema extremamente relevante para o país, face os valores envolvidos e a criticidade que pode gerar em ilegalidades como sonegação, inadimplência e adulteração dos produtos.

Para propor uma mudança desta magnitude, o correto seria percorrer todo o processo de Avaliação de Impactos Regulatórios e Tributários. Iniciar com estudos de impacto regulatório e econômico que demonstrem a necessidade dessa discussão e também a indicação de benefícios ao consumidor. Se estes estudos demonstrarem que existe um claro benefício para a sociedade e que os efeitos colaterais são entendidos (exemplo: aumento da sonegação) o processo deveria seguir com uma audiência pública para ouvir as partes interessadas.

Alguns pontos para reflexão:

Um posto de combustíveis não vende só etanol hidratado. Ele normalmente recebe em um único caminhão diesel, gasolina e etanol. Além disso, a gasolina no Brasil tem 27% de etanol anidro que precisa sair da usina e ir para a base da distribuidora, onde ocorre a mistura com a gasolina recebida da refinaria. Portanto o etanol hidratado já se beneficia do transporte conjunto com o etanol anidro.

As usinas não têm estrutura logística para chegar aos mais de 40 mil postos espalhados pelo Brasil. Isso só é possível hoje após bilhões de reais em investimentos por parte das distribuidoras.

A regulação vigente define claramente os papéis e responsabilidades de cada agente ao longo da cadeia de suprimentos. Nada impede que uma usina tenha também uma distribuidora, desde que cumpra com as regras estabelecidas pela ANP para este segmento.

Os produtores teriam de encontrar capacidade de substituir a eficácia operacional e de baixo custo dos sistemas de dutos, ferrovias e bitrens garantidos pelas distribuidoras para colocar o combustível na rota da usina ao posto. Sem essa estrutura, vai aumentar o tempo total de viagem no processo de entrega direta em razão da fragmentação dos volumes pelos postos de revenda, o que pode ser um problema sério para as localidades mais distantes das regiões produtoras, que estão concentradas essencialmente no interior de São Paulo, Centro-Oeste e Nordeste.

A saída das distribuidoras deste processo de venda do etanol hidratado também causará perda de escala na contratação de frete, além do aumento de custos administrativos e operacionais para atividades de carregamento/armazenagem, faturamento, crédito, cadastro, programação e atendimento.

Um estudo da consultoria Leggio demonstra que um novo modelo do etanol da usina direto para o posto aumentaria o custo de transporte em 24,7% da realidade atual, o que representa R$ 181 milhões adicionais por ano. Além disso, o aumento do custo do frete, provocado pela perda de escala, representaria outros R$ 34 milhões no caso do etanol anidro e mais R$ 252 milhões nos casos de diesel B e gasolina C, além de outros custos administrativos e operacionais decorrentes desta mudança.

Importante lembrar que 58% dos postos operam com marcas. Ou seja, estes postos não poderiam comprar diretamente de uma usina, pois isto fere o Código de Defesa do Consumidor, ou seja, estariam enganando o consumidor. Uma analogia simples seria o consumidor ir a um restaurante de fast food da marca X e ali estar sendo vendido um sanduíche da marca Y. O modelo vigente viabiliza mecanismos de fiscalização dos agentes regulados e sua respectiva responsabilização pelas atividades efetuadas.

Só em 2017, a estimativa da ANP é que R$ 5,9 bilhões foram arrecadados em ICMS de venda de etanol em todo país. Considerando que as distribuidoras são as responsáveis por arrecadar a maior parte deste valor, sem a distribuidora na cadeia, quem vai arrecadar esta parcela do tributo?

Pelas regras em vigor, o produtor/importador e o distribuidor são ambos responsáveis pelo recolhimento do PIS-Cofins e pelo ICMS incidente sobre a venda do etanol hidratado. A ausência do distribuidor exigirá mudanças na legislação que regula a cobrança tanto do tributo federal como tributo estadual, o ICMS. Sem estas mudanças na legislação, teríamos uma enorme assimetria de preços na comercialização do Etanol Hidratado.

Outro aspecto relevante é o programa RenovaBio. Ele é ancorado nas distribuidoras, já que elas serão as responsáveis pela aquisição do CBIOS a serem emitidos pelo setor produtivo. Baseado na recente meta aprovada pelo CNPE de redução de emissões de 10,1% para os próximos 10 anos, o RenovaBio prevê para 2028 um volume total de 36 bilhões de litros de etanol hidratado, 11 bilhões de litros de anidro e 11 bilhões de litros de biodiesel. Resumindo: a maior parcela vem do etanol hidratado.

Neste contexto, a venda direta inviabiliza o RenovaBio da forma como foi aprovado no Congresso. Ou seja, o projeto que deu uma tremenda previsibilidade e potencial para expansão do setor em menos de corre o risco de perder sua efetividade.

Por fim, a União da Indústria de Cana-de-açúcar (Unica), entidade que representa os produtores de etanol, a Plural e a Brasilcom, que representam as distribuidoras, e a Fecombustíveis e o Sincopetro, que representam os revendedores, são contra a proposta. Ou seja, a cadeia inteira é contra, pois a proposta, além de trazer uma enorme insegurança para o setor, não deixa ser percebido nenhum benefício para o consumidor.

EPBR - 28/10/2019

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