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"O carro elétrico é símbolo da mudança da indústria", diz diretor da Nissan

30 de Setembro de 2019

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O jornalista Rogério Louro, diretor de comunicação da Nissan no Brasil, fala à rádio Super 91,7 FM sobre a transformação cultural que os veículos elétricos estão promovendo no mundo todo.

Segundo ele, há, no Brasil, uma massa de veículos “atrasados”, mas também temos tecnologias de ponta chegando. O que podemos esperar da Nissan nesse quesito?

O carro elétrico é o grande símbolo da mudança da indústria automobilística. Começamos a vender o Nissan Leaf no Brasil em julho, em algumas cidades. O Leaf foi o carro elétrico mais vendido do mundo, produzido em três países, presente em mais de 50 mercados.

Temos um histórico que poucas (montadoras) têm. Desde 2010, nós vendemos o Leaf. No Brasil, chegou agora, mas o importante é que o país não está perdendo o trem. Ainda há, no país, um mercado muito pequeno, mas vai crescendo aos poucos, como foi no mundo todo.

Temos que trazer para o Brasil o carro elétrico, o autônomo, os mais conectados. Se a gente for esperar ter a infraestrutura perfeita, o sinal de Wi-Fi perfeito, não faz.

Ao mesmo tempo, trazendo para cá, mostramos para outras empresas e outros setores que têm gente se movimentando. O importante é lembrar que não é uma ruptura, que, do dia para a noite, vai acabar o carro a combustão e só ter carro elétrico.

É gradativo. Vai haver uma transição. Para algumas pessoas, vai ser mais rápido. Não só por questão de custo, mas por filosofia. Para outros, vai demorar mais. Temos que ser conscientes disso. Mas acreditamos que é um futuro sem volta.

Que mitos existem em torno do carro elétrico?

Primeiro, a autonomia. Hoje, no Brasil, você não vai de Belo Horizonte a Fortaleza de carro elétrico. Não tem uma estrutura para isso. Mas esse público que faz longas viagens é muito pequeno.

Um estudo dos órgãos de trânsito diz que a média de quilometragem que o brasileiro roda por dia fica em torno de 40 km, 42 km. Um carro elétrico como o Nissan Leaf tem autonomia – pela medição mais rígida – de 240 km.

Se você roda 42 km, em média, por dia, e a autonomia é de 240 km, nunca vai ficar sem bateria. O segundo ponto é que tem uma outra lógica de abastecimento. Normalmente, a pessoa carrega o carro elétrico, usa de dia, chega em casa e coloca na tomada.

Na manhã seguinte, ele está com 100% de carga. É diferente do que fazemos hoje com o carro com motor a combustão. Normalmente, só quando o combustível está quase no final você procura um posto. Já o carro elétrico, todo dia, quando você acorda, está com 100%. É uma nova maneira de conduzir.

E tem outros mitos mais curiosos. Tem gente, por exemplo, que acha que carro elétrico, na chuva, dá choque.

Tem também a transição do veículo híbrido. O que é a tecnologia e-Power? Quais são os planos da Nissan, em produto, para esses próximos dois ou três anos?

O importante é, primeiro, a chegada do Leaf. Não iríamos trazer nosso carro elétrico para o Brasil se a gente não acreditasse no futuro do país. Não é uma aposta de volume, hoje; é uma aposta de construção de mercado para o futuro.

Da mesma forma, temos planos de continuar crescendo no Brasil. Temos uma fábrica em Resende, no interior do Rio de Janeiro, com capacidade produtiva grande, moderna. Em dezembro, a empresa faz 19 anos no Brasil, cinco com a fábrica própria.

Somos uma empresa jovem, apesar de ter mais de 80 anos no mundo. Queremos conquistar cada vez mais espaço. Para isso, claro, tem que ter produto, tem que ter tecnologia.

Eletrificação é um ponto muito forte para nós. A eletrificação não é só o carro elétrico plug-in, como chamamos o que se liga na tomada. Nós temos esse sistema e-Power, que é um carro que tem motor elétrico, com tração elétrica – quer dizer, ele é movido como um elétrico, mas, em vez de parar em uma tomada para carregar, há um pequeno motor a gasolina, em que você coloca o combustível em um tanque menor.

Ele gera eletricidade para o motor, que faz o carro rodar como um elétrico: não tem o barulho, tem um torque muito forte, uma força grande na aceleração. Mas não precisa parar para carregar e tem uma autonomia muito maior do que um carro a gasolina normal.

Esse sistema foi lançado no Japão, em um modelo que já existia, o Nissan Note, que estava em nono lugar em vendas. Quando se lançou essa tecnologia, ele se tornou o carro mais vendido do Japão.

Tem previsão de vir para o Brasil?

O carro, não, mas a tecnologia... Estamos olhando com carinho.

Há alguns meses, falou-se de uma fusão entre a FCA e a Renault. A Renault, todos sabem, é parceira da Nissan. Isso não se concretizou. Teve alguma interferência da Nissan?

A aliança Renault-Nissan-Mitsubishi é muito forte. Juntas, somos o maior grupo automotivo do mundo, e são negociações sempre muito complexas. Não é que uma interfere na outra, mas existe, claro a necessidade de ser bom para a aliança.

Ainda existe essa possibilidade?

É uma discussão de nível global. É decidido pelas matrizes, e hoje, pelo que sabemos, está parado. Mas o mundo dos negócios vive evoluindo.

Como está a venda de carro elétrico?

Está vendendo, mas é mais complexa do que a gente esperava.

É muito segmentado?

É muito segmentado, e é um comprador que conhece, que quer cada detalhe...

Não é um consumidor que quer só um meio de transporte. Ele quer uma declaração de um estilo de vida.

Tem estilo de vida, consciência ecológica, status, tem a pessoa que gosta de conviver com a inovação. É um pouco de tudo. É gente muito detalhista e que quer saber tudo do carro antes de comprar.

É um comprador não tem pressa. Ele quer saber realmente como o carro vai se adequar à vida dele na questão de autonomia, equipamentos, carregamento.

Você literalmente liga o carro na tomada de casa ou tem que haver uma estação de recarga?

A tomada tem que estar aterrada. Por lei, todas tinham que estar – por isso se criou esse terceiro pino nas tomadas brasileiras –, mas, na prática, não estão. Se colocar o cabo de carga mais simples do carro, que a gente chama de cabo de emergência, numa tomada que não for aterrada, não vai carregar.

Nós estamos dando uma solução completa com o Leaf: a gente dá esse cabo, um “wall box” – tipo um reloginho que o dono coloca na parede e tem um cabo que carrega mais rápido – e um adaptador. Não existe um padrão mundial de conector para carro elétrico.

O nosso tem uma entrada, outras marcas têm outras. Para dar mais versatilidade aos consumidores, estamos dando esse adaptador. Se tiver um carregador na rua, num shopping, por exemplo, e não houver um conector para o tipo de plugue do Leaf, o dono do carro tem esse adaptador. Isso é para o proprietário ficar tranquilo.

O que ele vai usar mais é o wall box, em casa. Na tomada, demora um pouco mais de dez horas para carregar a bateria do carro em 100%. Com o wall box, leva entre cinco e seis horas. A pessoa roda de dia e carrega de noite.

Ou seja, vai usar muito pouco o cabo de emergência ou o adaptador. Mas isso dá segurança, quebra o medo de ficar sem bateria. É muito difícil alguém ficar sem bateria. Só que existe, sim, o fator psicológico.

Como agora que se está começando a ter veículos elétricos vendidos no país, é uma barreira psicológica que a indústria automotiva vai ter que quebrar. Não é receio de um ou de outro modelo. É receio do carro elétrico. É preciso dar muita informação.

Até porque não é uma compra impulsiva.

Não. Não é um carro com preço baixo. A pessoa tem que ser conquistada. É um namoro, não é um flerte – para resgatar uma palavra antiga. Mas é namoro longo.

É uma mudança da matriz energética toda.

Sim, e o Brasil tem muitas vantagens. É claro que tem o etanol, mas também tem a vantagem de a maior parte da nossa energia ser hidrelétrica.

E aí vem outro mito, de que o carro elétrico vai consumir um absurdo, e o Brasil não teria condições de sustentar uma frota grande. Primeiro, estamos falando de uma evolução gradativa. A energia é renovável, e o consumo é muito pequeno.

Essa recarga da bateria do carro durante a noite representa quanto da conta de luz?

É como um ar-condicionado. Vai depender da maneira que se dirige. Em média, abastecer carro elétrico, para rodar a mesma quilometragem, corresponde a 25% a 30% do que se gasta com um carro a combustão. Depende do motorista, mas é a média.

Se você gasta R$ 1 para rodar “X quilômetros” com um carro a gasolina, vai gastar R$ 0,25 para rodar os mesmos quilômetros com um elétrico.

Ou seja, quem gasta R$ 600 por mês com gasolina ou etanol vai ter despesa entre R$ 150 e R$ 200 com o elétrico.

Isso. A Nissan teve um projeto experimental com o Leaf de 2012 a 2016. Nós tivemos 15 táxis elétricos rodando no Rio e dez em São Paulo.

Por que taxistas?

Primeiro, porque o táxi é um dos serviços mais pesados, que exige mais do carro; segundo, porque o taxista depende do carro para viver – ou seja, se não atender à necessidade, ele vai ser o primeiro a não querer.

Em 2016, quando o projeto foi concluído, a maioria queria comprar o carro, e não devolver.

O motorista parava no horário de almoço e, enquanto comia, usava um carregador rápido (“quick charger”) para abastecer 80% da carga entre 20 a 30 minutos. Depois de meia hora, voltava a trabalhar.

Nenhum nunca precisou usar outro carro, só trabalhava com o Leaf. Para nós, foi a melhor prova. Além de ter pesquisa mundial sobre o consumo, a gente teve esse retorno aqui no Brasil.

A gente tem vários “Brasis”. Como se trabalha a comunicação para públicos tão diferentes?

É isso que você falou. É trabalhar um Brasil diferente. Se o revezamento da tocha olímpica, rodando 90 dias por mais de 300 cidades brasileiras, nos ensinou alguma coisa, foi que o Brasil é um grande país, com vários Brasis, várias regiões com características culturais e necessidades diferentes.

Não estou falando só de uma mais rica e outra mais pobre. Até o acolhimento é diferente. A gente tem pregado na Nissan o regionalismo. Você tem que ter linguagens diferentes. E aí a tecnologia ajuda muito. A quantidade de dados que temos hoje ajuda a tentar compreender o que o consumidor quer saber, qual a demanda dele, e trabalhar geograficamente.

Dar tiro de canhão funciona?

Funciona. Mas o custo de um tiro de canhão é enorme. Trabalhando segmentos você atinge mais, com um custo não necessariamente mais baixo, mas com um retorno melhor para o investimento. Estamos batendo muito forte nessa tecla: transparência e honestidade. É não ter medo de falar abertamente. Ninguém tem o carro perfeito.

Mas o seu carro pode atender ao que uma parte dos consumidores quer. E, para esses, você tem que ajudar, destacar, ressaltar. Nossa visão mundial hoje é mobilidade inteligente. Inteligente, para nós, não é ter um carro com de 10 mil botões.

É ser útil. Não adianta ter um botão que aciona um micro-ondas para cachorro-quente no porta-luvas. A pessoa não vai usar. É legal como marketing, mas de que adianta ter 20 equipamentos dos quais dez não têm utilidade prática? (...) A gente se guia por isso. O útil tem um custo. O que não é útil também. Não faz sentido pagar por algo que você não vai usar.

Fonte: O Tempo – 29/9

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