Notícias

Desmonte ambiental pode prejudicar exportações

20 de Agosto de 2019

Notícias

O desmonte agressivo das instituições incumbidas de proteger o ambiente patrocinado pelo presidente Jair Bolsonaro ameaça as florestas e os negócios das empresas brasileiras. Bolsonaro brinca com fogo ao ironizar os governos da Noruega e da Alemanha - dos poucos que aplicaram recursos significativos em prol da Amazônia - e criticar suas políticas ambientais. Enquanto diz que o dinheiro que seu governo administra acabou, dispensa com provocações recursos que nada lhe custam, além de incentivar reações de governos que têm o poder de destruir o acordo com o Mercosul, como os da França e Alemanha, as maiores economias da zona do euro.

A reação dos empresários começa a se fazer ouvir. O presidente da Suzano, Walter Schalka, defendeu a preservação da floresta amazônica e lembrou que seu negócio é baseado em árvores 100% plantadas, originadas de reflorestamento. Schalka receia que o setor possa sofrer reflexos negativos das posições do governo. O presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), Marcello Brito, endossa essa preocupação. Como diretor-executivo da Agropalma, maior produtora de óleo de palma, disse que "é só dar uma passadinha aqui na Amazônia, não precisa ir muito além de Belém ou de Manaus para assistir a isso de camarote", referindo-se ao desmatamento.

Brito disse que a grande maioria dos empresários do agronegócio já entendeu que o setor depende da preservação do meio ambiente para ter terras de qualidade e água, e também pela exigência do mercado internacional de respeito à agenda ambiental. O ex-ministro da Agricultura, Blairo Maggi, ganhador do prêmio "Motosserra de Ouro" do Greenpeace, afirmou recear que o discurso de Bolsonaro leve o agronegócio à "estaca zero", após anos de esforço para convencer o mercado internacional de que a produção brasileira é amigável ao meio ambiente.

O governo coleciona inúmeros embates na frente ambiental e não parece preocupado com as possíveis implicações econômicas da discussão. Já no início do ano combatia o projeto da Igreja Católica de eleger a Amazônia como tema do Sínodo deste ano. Na reunião do G-20, em junho, no Japão, Bolsonaro foi ostensivamente hostil a autoridades europeias como o presidente da França, Emmanoel Macron, e da Alemanha, Angela Merkel, pelas preocupações em relação ao ambiente.

As discussões com os dois principais patrocinadores do Fundo da Amazônia, a Alemanha e Noruega, que começaram com a reformulação do conselho e chegaram ao questionamento do destino dos recursos e insinuações de interferência na soberania nacional, tiveram o fim previsível na semana passada. A Noruega, que contribuía com mais de 90% dos recursos, suspendeu o envio de cerca de R$ 130 milhões; e a Alemanha, com uma fatia de quase 6%, congelou o equivalente a R$ 155 milhões. Bolsonaro zombou das decisões, lembrando que a Noruega caça baleias e explora petróleo no Ártico, e acrescentou que o dinheiro poderia ajudar a Alemanha a recuperar suas florestas. Os governadores da região já pensam em negociar recursos diretamente com os europeus.

O estilo de Brasília tem seguidores. O governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), cancelou o apoio da Polícia Militar às operações do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), depois da retirada do respaldo da Força Nacional pelo Ministério da Justiça, levando os fiscais a suspenderem suas incursões com receio de ataques de garimpeiros e posseiros. Fazendeiros do Estado comemoraram com um "dia do fogo", espécie de festa da queimada.

Após 30 anos usando o sistema do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que engloba o Deter, provedor de informações diárias da situação nas florestas, e o Prodes, que consolida dados em 12 meses, o governo Bolsonaro quer mudar de fornecedor. Queixou-se de que os levantamentos do Deter seriam divulgados com estardalhaço. Mas os números é que são explosivos: em julho, o Deter apurou aumento de 278% do desmatamento em relação ao mesmo mês de 2018. É esperado para breve o resultado anual do Prodes.

A ameaça de mudança de termômetro do desmatamento apenas amplifica as desconfianças, pois os levantamentos disponíveis, do Inpe e de Ongs, apontam aumento da destruição ambiental. O governo não o coíbe, não mostra preocupação, o que na prática é um incentivo velado ao ataque ambiental.

Valor Econômico - 20/08/2019

Veja também