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Concentração em usinas e CDI atrapalham CRAs

08 de Novembro de 2019

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Quatro ofertas de papéis de usinas de açúcar e álcool disputaram a atenção do investidor de varejo nas últimas semanas e comprovaram a tese de que o mercado está cada vez mais seletivo na compra de papéis.

Quase ao mesmo tempo, Açucareira Quatá (Zilor), Colorado e Adecoagro saíram com ofertas de certificados de recebíveis do agronegócio (CRA). As duas primeiras não alcançaram a demanda esperada; e a última ainda está em andamento. Além dessas, depois de ficar seis meses aberta, a Coruripe deverá encerrar a operação na semana que vem.

As operações foram ofertadas para o varejo, via Instrução CVM 400, e o CRA oferece isenção de Imposto de Renda para a pessoa física. As ofertas enfrentaram algumas dificuldades pela concentração setorial, especificidades de cada empresa e, também, pelo momento atual de reprecificação do crédito privado.

A oferta da Adecoagro está em andamento e as reservas dos investidores podem ser feitas até o dia 11. A empresa busca R$ 400 milhões e tenta emplacar os papéis em duas séries: uma atrelada a 104% do CDI com prazo de seis anos; e outra a IPCA + 3,80% ao ano, com prazo de oito anos.

A empresa possui três moinhos, em Minas Gerais e no Mato Grosso do Sul, com capacidade instalada de 14,2 milhões de toneladas ao ano. E, segundo a Eleven, foi uma das poucas do setor a apresentar crescimento de receitas e margens relativamente robustas em 2018.

Os especialistas da casa de análise recomendaram a compra somente da série atrelada ao IPCA. Eles consideraram que a série CDI só faria sentido se o percentual ficasse entre 108% e 109%.

Papéis atrelados ao CDI têm sido rejeitados pelos investidores, pois no cenário de taxa Selic na mínima histórica e com perspectiva de queda, eles tendem a ter retorno cada vez menor. Algumas emissões têm vindo a mercado sem elevar os percentuais, para adequarem-se a essa nova realidade.

Daniel Pegorini, sócio da Valora Investimentos, lembra que essas operações demoram de dois a três meses para serem estruturadas e lá atrás talvez a questão do CDI ainda não estivesse tão aguda. Mas, agora, esse indexador tem sido evitado pelo mercado, inclusive com investidores vendendo papéis com essa remuneração, o que acaba gerando oportunidades no mercado secundário.

“Com esse ajuste de preços, acredito que quaisquer dificuldades nas emissões tenham vindo mais desse movimento do que por conta de questões específicas das operações ou do ativo”, afirma Pegorini. Por conta desse ajuste de taxas, ele conta, houve situações de papéis de empresas “AAA” no mercado secundário estarem com taxas semelhantes ao dessas operações primárias, de empresas com rating menor. “Fica difícil competir”, afirma ele.

Odilon Costa, analista da Eleven, destaca que quase um terço das ofertas ICVM 400 deste ano foram do setor sucroalcooleiro, o que implica em pouca margem para diversificação do risco de crédito. “A maioria das usinas está localizada na região centro-sul e, consequentemente, sujeita a condições climáticas muito parecidas e a riscos semelhantes”, diz.

Segundo Costa, existem algumas diferenças microeconômicas relevantes entre os usineiros, como o viés de produção (mais açucareiro ou alcooleiro), a flexibilidade de mudar o mix quando necessário e o nível de governança corporativa. E há, também, empresas mais ou menos endividados e CRAs com níveis distintos de complexidade. Desde janeiro, as sucroalcooleiras já captaram cerca de R$ 4 bilhões via CRA. Houve emissões de nomes mais “high grade”, como Raízen, Adecoagro e São Martinho; e mais “high yield”, como Coruripe e Zilor.

Nesse panorama, a usina Colorado, que buscava R$ 200 milhões para um prazo de cinco anos e remuneração de CDI mais até 1,35% teve de suspender a operação, diante da falta de demanda. A operação é coordenada por Itaú BBA, BNP e Santander. O Valor apurou que ela poderá ser retomada no mês que vem. Nesse caso, a Eleven apontou que a taxa ofertada estava menos atrativa do que a de emissões “high grade” do setor e o pacote de garantias e covenants era insuficiente para mitigar o risco de liquidez da devedora.

A Açucareira Quatá (Zilor) lançou uma oferta de R$ 700 milhões em CRAs, que, de acordo com informações de mercado, fechou em R$ 600 milhões, contando com a garantia firme dada pelos coordenadores, XP e Itaú BBA. A XP só teria conseguido vender na plataforma perto de R$ 30 milhões, conforme fontes. Essa operação foi a segunda que veio a mercado tendo como garantia créditos do Instituto de Açúcar e Álcool (IAA).

A primeira oferta que veio com esse tipo de garantia foi a da Coruripe, que fez uma distribuição continuada na plataforma da XP destinada a investidores qualificados. A empresa busca R$ 800 milhões, que serão cruciais para solucionar problemas de liquidez de curto prazo da usina. De acordo com fontes, até o momento a XP conseguiu vender R$ 220 milhões. Todos os coordenadores das emissões foram procurados, mas não deram entrevista, por conta do período de silêncio dessas operações.

Fonte:  Valor Econômico – 08/11/19

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