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Apesar de déficit global de açúcar, usinas cancelam embarques

16 de Setembro de 2019

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Faltam poucas semanas para o início da primeira safra de déficit de produção global de açúcar (2019/20) após duas temporadas de superávit, mas ninguém no mercado está contando as horas para isso acontecer. Embora uma diferença negativa entre produção e consumo no mundo costume ser um fator de alta dos preços, vários fatores de pressão ainda pairam sobre as cotações, e usinas brasileiras que têm condições estão até desistindo de exportações já negociadas.

“Enquanto tiver dinheiro na mesa, vai ter washout [cancelamento de contratos de exportação]”, afirmou Luiz Silvestre, diretor da trading francesa Sucden. Os preços do açúcar estão oferecendo uma remuneração mais de 200 pontos menor que a do etanol. Silvestre não estima o número de cancelamentos, mas acredita que não supere a quantidade registrada na safra nacional passada (2018/19, que terminou em abril).

Ontem, o Rabobank elevou sua estimativa para o déficit global de açúcar da safra 2019/20 em 1 milhão de toneladas, para 5,2 milhões de toneladas, seguindo exemplo da Organização Internacional do Açúcar (OIA), que no dia 2 elevou sua projeção de déficit em 1,7 milhão de toneladas, para 4,763 milhões.

Mas os dados de OIA e Rabobank nem fizeram cócegas nos traders. No fim de agosto, a Índia, desafiando concorrentes que a questionam na Organização Mundial do Comércio (OMC) - o Brasil entre eles -, anunciou mais subsídios à exportação em 2019/20, para até 6 milhões de toneladas, ante 4 milhões de toneladas no ciclo atual.

Resultado: desde o início do mês, os contratos do açúcar demerara na bolsa de Nova York, mesmo os com vencimento ao longo de 2020, passaram a cair ainda mais. Os papéis para outubro voltaram a descer abaixo dos 11 centavos de dólar a libra-peso e acumulam queda de 38 pontos no mês até ontem (quando fechou a 10,76 centavos de dólar a libra-peso); os lotes para março de 2020 cederam 39 pontos; e os para maio, 42 pontos. Esses últimos dois vencimentos voltaram a ficar abaixo de 12 centavos de dólar a libra-peso.

Silvestre não acredita que os indianos conseguirão embarcar todo o volume que pode ser subsidiado, mas crê que a nova rodada de apoio continuará a “roubar” mercados brasileiros. “Eles têm a vantagem de estarem próximos de alguns destinos. Com o subsídio, todo o leste africano passa a ser atendido pela Índia com açúcar cristal”, afirma ele.

Tão ou mais importante para os preços do que a situação indiana é o excesso de açúcar nos estoques mundiais, inclusive nos principais exportadores. “O Brasil tem estoque, já que as exportações estão lentas; o estoque na Índia está muito alto; a Tailândia também tem estoque, embora de um açúcar não desejado; e mesmo a América Central e o México também estão com mais estoques”, comentou Raissa Silva, chefe de pesquisa de açúcar da trading britânica ED&F Man.

Para o Rabobank, conforme o déficit global se materializar os estoques vão voltar à média histórica. O banco projeta que isso vai ocorrer até setembro de 2020, o que oferecerá fundamentos mais positivos para as cotações.

Desde o início da atual safra do Centro-Sul até agosto, os embarques brasileiros de açúcar estão 9,9% abaixo do mesmo período da temporada passada, somando 7,76 milhões de toneladas, segundo dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex). Considerando que os embarques da região Nordeste representam cerca de 500 mil toneladas e que o Centro-Sul produziu 18 milhões de toneladas até agosto - dos quais um terço costuma ficar no país -, ainda há nos estoques das usinas do Centro-Sul cerca de 4 milhões.

“Da última vez em que os preços do açúcar reagiram a um déficit, a relação entre estoque e uso global estava abaixo de 30%. Agora está acima desse nível. Hoje, mais importante que o déficit é o estoque”, ressalta Silva. Para a OIA, os estoques globais até 30 de setembro alcançarão 95,1 milhões de toneladas e devem cair apenas para 90,3 milhões de toneladas dali um ano. “Até o estoque ser digerido, vai ser difícil enxergar alguma coisa alvissareira para os preços”, lamentou Silvestre.

Fonte: Valor Econômico – 13/9

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