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Abran sugere rotulagem de alimentos alternativa

07 de Maio de 2018

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Uma terceira possibilidade de rotulagem foi sugerida pela Associação Brasileira de Nutrologia (Abran), depois das outras, em dezembro do ano passado. É o Nutri-score, baseado no perfil de nutrientes da Brittish Standards Agency e aprimorado por pesquisadores na França. Basicamente, ele avalia cada alimento de acordo com a densidade nutricional, ou seja, a qualidade nutricional é analisada como um todo, incluindo os ingredientes bons e ruins para a saúde.

Os produtos são classificados por letras e cores: do verde (classificação A para alimentos de melhor qualidade nutricional) ao laranja-escuro (classificação E para os de pior qualidade). No estudo desenvolvido na França para decidir o melhor rótulo nutricional, quatro opções foram comparadas e o Nutri-score considerado o melhor.

“Com uma combinação de letras e cores conseguimos orientar o consumidor sobre as características de cada produto e isso vai ajudá-lo a fazer a escolha mais adequada à sua dieta”, justifica Carlos Alberto Nogueira de Almeida, membro do conselho científico da Abran.

De uma forma ou de outra, o excesso de açúcar, de gorduras trans e saturada e de sódio contribui para a obesidade e para muitos outros problemas de saúde, como hipertensão e diabete. “O foco nos ingredientes tira o foco real, que deveria ser a relação das pessoas com o alimento. Quando a gente ‘vilaniza’ um alimento, como está ocorrendo com o açúcar e já ocorreu com o ovo e com a manteiga, a gente cria heróis e vilões e não trabalha o contexto em que eles são consumidos”, reflete Márcia Daskal, nutricionista especialista em nutrição e dietética e proprietária da Recomendo Assessoria em Nutrição e Qualidade de Vida.

Como exemplo, ela cita os franceses, conhecidos por comer muito pão, muito doce e cuja culinária é carregada a manteiga e queijo. “Poderia se pensar que eles se alimentam mal, mas não é uma sociedade obesa. Por quê? Eles caminham, eles comem pequenas porções”, explica. E é por isso que muitos especialistas ressaltam que a palavra excesso não pode ficar fora do discurso. Os nutrientes críticos não seriam ruins para a saúde em si, mas sim o exagero deles.

Conscientização

O gerente executivo do Conselho Nacional da Indústria (CNI), Pablo Cesário, ressalta a necessidade de mudar a mentalidade. “Esses são responsáveis só por 15% do consumo de sódio do país. Os outros 85% são adicionados pelo consumidor na mesa. O mesmo ocorre com o açúcar. É preciso criar uma dinâmica em que se aumente a procura por alimentos mais saudáveis e saborosos”, afirma.

“O sódio em excesso pode causar desidratação, problemas renais e hipertensão. O excesso de açúcar aumenta o índice glicêmico e a produção de insulina, responsável pela quebra da glicose no sangue, até que o corpo fica resistente a ela: é a diabete tipo 1. E, por fim, a gordura se aloja nas artérias e pode provocar o entupimento delas”, explica Jamilly Drago, endocrinologista da Clínica Metasense.

Ela explica que o motivo por que se acrescenta tanto sódio, açúcar e gorduras aos alimentos industrializados é que eles são ótimos conservantes. Além disso, o sódio e o açúcar têm o poder de mascarar os gostos. “Um chocolate com muita manteiga de cacau não teria o gosto bom. Então, coloca-se mais açúcar para disfarçar e ficar mais gostoso. Ou em uma batata frita que ficou engordurada, coloca-se sal para disfarçar”, explica.

Tanto a obesidade causada por esses excessos quanto a hipertensão e a diabete são fatores de risco para o tipo de doença que mais mata no Brasil e no mundo, segundo a Sociedade Brasileira de Cardiologia: as cardiovasculares. O órgão estima que uma pessoa morra por tais causas a cada 40 segundos.

Vida sem industrializados

Pesquisa do Ministério da Saúde e da Agência Nacional de Saúde Suplementar, divulgada no início deste ano, mostrou que a obesidade entre os adultos beneficiários de planos de saúde aumentou de 12,5%, em 2008, para 17,7% em 2016 – crescimento de mais de 40%. Mais de 50 mil pessoas foram entrevistadas, e consideradas obesas aquelas com Índice de Massa Corpórea (IMC = peso/altura²) superior a 30.

Outro levantamento do Ministério da Saúde, divulgado no ano passado, além de identificar o aumento da obesidade no país concluiu que o excesso de peso cresce com a idade e é ainda maior entre os que têm menor grau de escolaridade. Daí vem a necessidade não só de uma tabela nutricional tão clara quanto possível, como outras ações de educação.

Atualmente, a estudante de nutrição Thaiz Brito, de 25 anos, quase não come produtos industrializados que passaram por muitas fases de processamento. Para ela, isso já virou um estilo de vida. “Quando entrei na faculdade, já estava consciente sobre alimentação, mas fiquei mais ainda”, relembra. Quando decide comprar algo industrializado, ela checa a tabela nutricional e escolhe aquele com o mínimo de ingredientes.

Quando mais jovem, ela via produtos classificados como diet ou light e acreditava que eram saudáveis ou que tinham poucas calorias. “Hoje, sei que é estratégia, e isso não é, necessariamente, verdade. O produto light tem menos calorias que o tradicional, mas pode ser de 5% a 90% a menos. Já o diet não tem açúcar, então, é ideal para diabéticos, mas pode ter mais gordura ou outras substâncias que, em excesso, não fazem bem.”

Antes, Thaiz comprava pão integral acreditando na classificação dele como tal. Só tempos depois descobriu que essa é uma pegadinha comum: na parte da frente da embalagem, em letras grandes, está “integral”; atrás, em letras minúsculas, na tabela nutricional, especifica-se que apenas uma pequena parcela da farinha usada é integral e a maior parte é branca. A estudante nem come pão mais. “Muita gente se engana por não ter conhecimento.”

Bebidas açúcaradas

Outro movimento com o objetivo de melhorar a saúde da população brasileira afeta a indústria de bebidas açucaradas. Dois projetos de lei correm no Senado Federal (360/2014) e na Câmara dos Deputados (8.675/2017), na tentativa de fazer algo já feito no México: sobretaxar as bebidas adicionadas de açúcar. O projeto mais recente cita outros países que adotaram a medida, como França, Finlândia e Hungria.

O deputado Sérgio Vidigal (PDT-ES) explica que seu projeto foi uma resposta a uma sugestão da Organização Mundial da Saúde (OMS), feita em 2016. Na ocasião, o órgão divulgou estudo que indicava que o aumento da tributação seria uma forma de reduzir o consumo e, consequentemente, as doenças relacionadas ao excesso de açúcar.

 “Nos países em desenvolvimento, é onde o sobrepeso mais cresce. Claro que é multifatorial, mas um dos fatores é a má alimentação. Não estamos em um luta contra a indústria, mas, muitas vezes, um litro de refrigerante é mais barato que um litro de água de coco”, argumenta Vidigal.

Para Alexandre Jobim, diretor-presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e de Bebidas Não Alcoólicas (Abia), a contribuição extra é discriminatória: “E a coxinha vendida nas escolas?”, questiona. Ele cita estudo da Vigitel, realizado entre fevereiro e dezembro de 2016, em que foram entrevistadas, por telefone, 53.210 pessoas com mais de 18 anos e evidenciou-se que, se, por um lado, o consumo de refrigerante diminuiu em cerca de 11%, por outro, a obesidade aumentou em 10%.

Jobim ressaltou a responsabilidade social das empresas: “Desde 2016, por conta própria, não fazemos mais publicidade infantil, e 80% das indústrias já aderiram à decisão de não vender nas escolas para crianças até 12 anos. Além disso, nos últimos cinco anos, reduzimos o açúcar em 11%. Sem falar na diminuição do tamanho das embalagens.”

A experiência do Chile

Desde 2016, quem vai ao supermercado no Chile talvez pense duas vezes antes de comprar algo com um octógono de fundo preto na frente do produto escrito “alto em azúcares”, “alto en grasas saturadas”, “alto en sodio”, “alto en calorías”. Demorou 10 anos entre a aprovação da lei que exigia os selos e a implementação dela, mas virou um exemplo positivo usado pela OMS.

Foram criadas, ainda, outras normas, como a proibição da venda de alimentos que contenham selos em escolas e o veto da publicidade de produtos com selos direcionada a crianças nos meios de comunicação. Assim, os com embalagens com mais açúcar, gordura ou sódio do que o estabelecido em lei que usavam personagens infantis, tinha brindes ou qualquer atrativo para os pequenos não podem mais ser vendidos no país.

Seis meses depois da implantação do novo modelo, o Ministério da Saúde do país fez uma pesquisa com mais de mil pessoas e só 8,4% acreditam que a nova rotulagem não influenciou suas compras. Já 67,8% afirmaram que escolhem alimentos com menos selos e 9,7% disseram que não consomem alimentos com selos.

Fonte: Estado de Minas – 06/05/2018

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